Por trás de cada motorista, há uma história. Na maioria das vezes, uma jornada de coragem, sacrifício e superação. Às vezes, também, é uma história de amor. No caso de Catia Regine Muraro, 57 anos, a trajetória é todas essas coisas ao mesmo tempo. É sobre reconstruir-se como mulher, empresária, mãe, viúva e apaixonada pela estrada. Por isso que, nesta sexta-feira (25), não é celebrado apenas uma profissão. O que celebramos é o espírito de pessoas como Catia, que dirigem sua vida com coragem e propósito.
A paixão de Catia pela estrada nasceu ainda na juventude, enquanto estava na faculdade. Durante as férias, aceitou o convite do irmão para acompanhá-lo em uma viagem de caminhão. Foi o suficiente para se encantar com a liberdade da boleia.
Em 1987, ela comprou seu primeiro caminhão. Na época, namorava Itamar Pirolli, com quem se casou um ano depois. Ele acabou entrando na rotina das viagens ao seu lado, motivado principalmente pelo entusiasmo da companheira.
— Ele gostava mesmo era de futebol, mas como eu gostava da estrada, ele foi por mim. Nessa viagem (com meu irmão) eu gostei da aventura, gostei de viajar, aí me empolguei e também como ele via que a renda era boa, ele ia, porque tinha que fazer algo — recorda.
O casal enfrentou junto os desafios das longas viagens e as dificuldades do dia a dia, mas também colecionou momentos de alegria e cumplicidade que ficaram para sempre na memória.
— Nós fazíamos todo o Brasil. Uma vez em Belém, nós fomos carregar madeira e tínhamos que esperar ela chegar. Então, nós ficamos em um rio esperando e era uma aventura. Porque lá era um povo humilde, eles nos acolhiam e também não era que nem agora, não precisava fazer tantas viagens para ganhar dinheiro então podia ficar aproveitando um pouco nas cidades — conta.
“Continuar fazendo o que sei”
Em 1991, a história foi interrompida por uma tragédia. Itamar faleceu em um acidente de carro no centro de Flores da Cunha, aos 25 anos.
— Foi muito sofrido. Eu sofri demais. Eu não aceitava. Nós éramos novos, foi inesperado porque nós tínhamos sonhos. Ele queria ter filhos e eu não quis, porque eu era muito nova. Se eu soubesse que isso iria acontecer, eu teria tido um filho antes com ele. Mas tu nunca sabe o amanhã — lamenta.
Naquele período, Catia já não dirigia com frequência. Ela havia fundado a Muraro Transportes e Comércios, onde coordenava os fretes de terceiros. Com a morte de Itamar, ela se viu diante de uma escolha: recomeçar os estudos ou continuar no setor.
— Eu decidi continuar com a transportadora. Comprei mais um caminhão e coloquei um motorista. Sempre gostei de caminhão, então disse: vou continuar fazendo o que sei e aprendi tudo sozinha. Não adianta, a minha vida tinha que seguir — conta.
A vida de Catia ganhou um novo capítulo em 2000, quando reencontrou Delmir Antônio Muterle, 67, antigo namorado e amigo próximo. Em uma ocasião em que ficou sem motorista, chamou Delmir para acompanhá-la numa entrega em Curitiba. A viagem reacendeu sentimentos e deu início a uma nova união.
— A partir desse dia a gente começou a se bicar e depois de um tempo ele veio morar comigo. Ele começou nesse ramo dos caminhões por causa de mim. Eu ensinei ele, porque ele só tinha ido pra São Paulo de avião. Ele aprendeu comigo a dirigir e continuou depois — lembra.
Com o nascimento do filho Gabriel Muraro Muterle, em 2004, Catia passou a se dedicar mais à administração da empresa e aos cuidados com a família. Ainda assim, sente saudades do volante.
— Tenho muita vontade de voltar a viajar. O problema é o tempo. São seis caminhões pra cuidar, carga pra encontrar e minha mãe, de 84 anos, que também depende de mim — explica.
Mesmo após tantas mudanças, Catia faz questão de manter viva a memória de Itamar. Para ela, a transportadora que administra hoje representa o legado construído a duas mãos, desde os primeiros passos ao lado do falecido companheiro.
— A história começou com ele. Então no início deu desânimo, tu lembrar dele estar sempre presente contigo. Mas daí tem que buscar coragem e entender que ele não vai mais voltar — finaliza.