— Eu me sentia como uma mesa com quatro pernas, você tira duas e tem que manter de pé.
A analogia de Beatriz Cecconello Cavagnolli, 75 anos, se refere ao momento que se viu diante da missão que definiu sua vida: ser mãe. Após perder o marido, Fernando Cavagnolli, no final dos anos 1980, ela encontrou força para seguir nos filhos do casal, Mônica Cavagnolli Mioranza, 43, e Marcelo Cavagnolli, 39.
Quando o assunto eram os filhos, Beatriz sempre teve uma resposta rápida “eles são tudo para mim”. Uma resposta típica de mãe, mas verdadeira. Foi assim que a florense construiu a própria história e se tornou mãe, empresária, filha que cuida e, atualmente, avó.
— Não sei o que seria de mim se eu não tivesse os filhos. Eles são o meu apoio hoje. Eu vivi por eles, mas agora eles são tudo para mim — destaca novamente, com emoção na voz.
Em todas as fases, Beatriz esteve presente. Foi ela quem acompanhou consultas médicas, buscou no colégio, ouviu desabafos e risadas. Fez até o Censo de 2000, depois do expediente na loja, para conseguir uma renda extra.
— Eu trabalhava até as 17h, depois ia fazer o Censo. Fiz toda a área urbana daqui, claro que não era tanto quanto hoje, mas eu batalhei bastante. Foi um dinheiro bem suado, mas como eu disse, eu me preocupava muito com os filhos. Como é que ia ser o futuro deles. Graças a Deus, os dois fizeram a faculdade. Estão casados hoje, tenho dois netos, um menino e uma menina. A Mônica tem um menino (Luiz Fernando, 5 anos) e o Marcelo tem uma menina (Maria Fernanda, 4 anos). Essa é a minha vida — resume a moradora de São Gotardo.
Para Beatriz, a maternidade foi a razão para cada passo. Mesmo carinho que agora transcende aos netos.
— De vez em quando, o meu neto, principalmente, gosta de vir dormir aqui. Por ele, dormiria sempre aqui comigo. Ele diz “vó eu posso ir dormir contigo?”. Ele gosta de vir aqui e eu tenho que curtir até que são pequenos, que depois não vão querer nada com a velha — brinca.
“Tentei ser pai e mãe também”
Apesar da maternidade não ter sido uma surpresa na vida de Beatriz, o sonho de ser mãe foi surgindo depois de se casar. Ambos os filhos foram planejados pelo casal.
— Para eles (os filhos) eu fiz tudo o que estava ao meu alcance. Tentei ser pai e mãe também. Me emociono até hoje. Pensei “o que eu faço agora?”. Eu tinha uma mãe viúva também. Quando ela podia, me ajudava com as crianças, mas tinha horas que ela que precisava de mim — conta.
Em casa, o cuidado era constante. E mesmo em meio às dificuldades, não deixava de estar presente no que fosse preciso, até mesmo depois de adultos.
— Eles continuam sendo meus filhos. Os filhos da gente nunca crescem pra gente. São sempre iguais. Então, quando preciso dar um puxão de orelha, eu dou. Mas eles também me dão puxão de orelha. Eu me dou muito bem com eles, graças a Deus.
Entre brinquedos, conselhos e cachorro-quente, o lanche preferido dos pequenos, Beatriz construiu uma relação de confiança e afeto.
— Eu brincava com eles, eles gostavam muito de cachorro-quente ao invés do xis. Então eu levava eles lá e olhava para eles comendo aquilo. Tínhamos que ir seguido lá. E aqueles brinquedos que eles pediam, se eu pudesse dar, eu dava.

(Foto: Paola Castro)
Beatriz tem presença forte em São Gotardo, comunidade onde vive. Atua no Clube de Mães Safit desde que se tornou mãe, participa da igreja como Ministra da Eucaristia e se engaja em ações solidárias.
— Gosto de participar, de ajudar, de todas as funções que tem dentro da comunidade — sorri a aposentada.
Beatriz lembra com carinho de quando foi eleita Mãe Destaque em 2007, um reconhecimento coletivo às mulheres que participam do grupo de mães da comunidade.
— Sou uma mãe que se preocupa com os filhos, que dá tudo pelos filhos e que é feliz com os filhos que tem e com os netos também — enfatiza.
Ser mãe, para Beatriz, sempre foi mais do que obrigação. Era escolha. E ela optou por estar junto.
— Eu sempre fui mais de conversar com os meus filhos. Minha mãe não era muito aberta para dizer as coisas pra gente. Por exemplo, quando eu fiquei mocinha, eu nem sabia. Não sabia nada. Então, eu já passei para eles. Eu fiquei preocupada quanto ao meu filho. Como é que eu procedo porque ele não teve uma referência de pai. Tinha os tios que vinham aqui, o meu próprio irmão, mas ele não teve uma referência paterna, porque com três anos ele teve poucas lembranças do pai — considera.
Com o tempo as preocupações diminuíram ao ver a sensibilidade que o filho desenvolveu e ao longo dos anos, o cuidado de mãe também se transformou em carinho de vó.
— É mais difícil ser mãe hoje. A gente dá tudo que eles querem. Vó “dá barda”, mas eles são muito mais exigentes hoje. Não é como na minha época — compara.
Loja na sala de casa
O que pode parecer estabilidade, já foi desafio. Criar os filhos exigiu mais do que presença. Exigiu reinvenção diária, criatividade e, acima de tudo, fé. Responsável por criar a loja de roupas Bela Novitá, que hoje é administrada pela filha Mônica, Beatriz começou por acaso no mundo da moda.
— Sempre digo que Deus me deu a loja. Quando meu marido morreu, coloquei a camionete para vender. O senhor que comprou tinha uma loja e me deu a ideia. Tinha duas estantes, um balcão, uma arara, coloquei tudo nesse cubículo. Fiz um provador lá no canto, comprei um daqueles trilhos de cortina e eu mesma fiz uma cortina. Botei a loja aqui (na minha sala). Muita gente não acreditava, mas eu sempre tive fé — relembra Beatriz, sobre o início da loja no cômodo de sua casa.
Assim os filhos cresceram sob o olhar atento da matriarca.
— A Mônica já tinha 7 anos e ia para a escola, mas o pequeno ficava comigo o tempo todo. Depois que iam para a escola ficavam aqui. Meu filho e os amigos jogavam bola aqui do lado, e eu ficava sempre de olho, sempre preocupada, apesar de que na época não era tão preocupante quanto hoje — reflete.
Com o tempo, a filha mais velha se apaixonou pelo negócio da mãe e foi quem propôs a expansão. Juntas, elas venderam um terreno herdado do pai e construíram a loja nova na rua Belluno, em São Gotardo.
— Ainda bem que a Mônica gosta. Eu administrava antes dela e hoje ainda ajudo quando precisa. Mas ela que toca, ainda bem, porque hoje não teria condições. E também a gente não vai mais até São Paulo, agora tem os viajantes. É outra coisa, na época não existia celular. Era um telefone fixo — compara.
Beatriz conta que a loja era um meio de garantir a estabilidade financeira da família e a educação dos filhos.
— Uma coisa que me preocupava muito era como que eu iria pagar estudo para os meus filhos, como é que eu iria pagar a faculdade.