Mais uma vez, motoristas e agricultores se unirão em procissão em frente à Igreja São Marcos, em Otávio Rocha, para que seus caminhões e tratores recebam a tradicional benção de São Cristóvão, que tem seu dia celebrado nesta sexta-feira (25). A fé dá origem a Festa da Colônia, que chega a sua 51ª edição neste final de semana.
Pelo segundo ano, caberá ao padre Olavo Bombardelli, 63 anos, realizar a benção no Terceiro Distrito. Data que o pároco faz questão de lembrar a origem da devoção.
— Resumindo, Cristóvão era um homem muito forte que, após se tornar católico, decidiu morar às margens de um riacho de correnteza forte e perigosa. Assim, a maioria das pessoas não conseguia atravessá-lo sozinhas. Por ter braços fortes, ele punha um a um nos ombros ou colo e os ajudava no trajeto — ensina o sacerdote.
A história conta que, certo dia, um menino de estatura singela apareceu para a travessia.
— Cristóvão colocou a criança no colo e entrou na água, mas, a cada avanço, o garoto pesava mais e mais. Ao atingir a margem oposta do rio, ele estava exausto por ter transportado a tenra criatura, a quem disse: “menino, o mundo não é tão pesado quanto tu”. O garoto o olhou, sorriu e revelou: “tu levaste mais que o peso do mundo. Eu sou Jesus, o filho do Deus a quem tu serves, aquele que tudo criou” — conta o padre Olavo.
Por isso, São Cristóvão é conhecido como o “portador de Cristo” e padroeiro dos viajantes. Sua figura é comum na cabine de motoristas profissionais, que buscam proteção para atravessar um país que tem cerca de 65% de sua carga transportada por rodovias.
É o caso do caminhoneiro florense Ivan Carlos Molon, 48, que vai além em sua fé. Toda vez que dá a partida em um dos 14 caminhões da empresa de transporte da família, ele está acompanhado não somente da imagem em gesso do padroeiro São Cristóvão, mas também de Nossa Senhora Aparecida e de Nossa Senhora do Caravaggio. Com estes protetores ele realiza as entregas de vinhos, sucos e aguardente por toda a Serra e volta são e salvo para a esposa e duas filhas.
— Minha fé e devoção a ele, mas, também a elas, são necessárias para que eu vá, mas sempre volte — afirma Molon, que é caminhoneiro desde 1994.
Benção ampliada

(Foto: Nael Rosa)
Neste domingo (27), Molon, com seu caminhão, estará no congestionamento de gratidão que se formará na avenida Uva Itália para receber a benção.
— Aqui, em Otávio Rocha, será a primeira vez que, a nosso pedido, caminhões vão participar. Antes, eram somente tratores. Estou envolvido na organização da festa promovida pela Associação dos Amigos (de Otávio Rocha), mas não posso ficar de fora. Vou deixar um caminhão pronto, dou uma fugida, recebo a benção e volto correndo para ajudar nos preparativos — promete.
Mas, se o dia celebrado é o do Motorista, por que em Otávio Rocha somente tratores participavam da benção? A tradição remonta as datas da imigração no Rio Grande do Sul e também a proximidade do agricultor e dos motoristas, dependentes do trabalho um do outro.
— A procissão focava apenas nos colonos, cujo padroeiro adorado é Santo Isidoro. A partir deste ano, a pedido dos caminhoneiros, o trajeto contará com as imagens dos dois santos, ainda que de tamanhos singelos. Mas, a paróquia já decidiu encomendar em dimensões maiores — explica o padre Olavo.
A relação e importância dos dois santos é um ensinamento que Valter Muterle, 77, recebeu de berço. O agricultor da Estrada Granja São Mateus lembra com carinho da procissão de 1988, na 16ª edição da Festa, quando seu pai Francisco Ângelo Muterle, mesmo enfraquecido pelo câncer, não abriu mão de participar.
— Ele morreu meses depois, em novembro daquele ano, mas fez questão de se fazer presente pela última das dezenas de vezes que foi agradecer ao nosso padroeiro, o que eu também faço há 40 anos — recorda.
Na lida diária para o cultivo de morangos, uvas e tomates, Muterle já passou por anos difíceis, em que a colheita não foi boa, mas garante que isso nunca o fez esquecer de ser grato aos padroeiros.
— Todos nós que atuamos nessa atividade, dependemos da proteção dos dois santos. Eu, agradeço a Isidoro mesmo quando o resultado do trabalho não é positivo por causa das chuvas em excesso, tanto quando a seca nos castiga, porque, quando termina o ano, todos estamos bem de saúde e nunca nos faltou comida à mesa. E a Cristóvão, porque é o único dos três filhos que temos e que decidiu ficar na colônia, dirige o caminhão que distribui o que plantamos. Assim, festejamos e agradecemos — finaliza o patriarca.